quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

"soooooooooooora, eu te vi saindo da farmácia!!!"
ah, na terça, né? 
"é. eu passei com meu pai e tu nem me viu. Tu tava bem na porta da farmácia."
sei, aquela ali antes da tabacaria?
"é. acho que tu ia pegar o ônibus."
sim, tem uma parada bem na frente. Dá próxima, grita um oi.
"tá, mas sora, tu tava na farmácia fazendo o quê?"
ai, nem lembro, acho que fui só me pesar mesmo."
"é? só isso? sora, tu tá doente??"
ah, não, quer dizer, não que eu saiba, me sinto tri bem.
"mas é que sempre que meu pai vai na farmácia é pra pegar os remédios da minha vó que tá morrendo do coração, ela já nem sai de casa."
ah, sim, mas na farmácia a gente vai por vários motivos, as vezes só para comprar uma lixa de unha.
Pensa, me olha, segue me olhando.
"é, mas se tu tá mal, não adianta tomar remédio por conta, meu tio quase morreu por isso."
é, não dá pra se automedicar assim, todo remédio é um veneno também.
"é veneno também? bah, é por isso que eu cuspo sempre que me dão remédio."
tá, mas depende do quanto tu usa, as vezes precisa mesmo, mas só quando nada mais funciona.
"é. sabe aquele livro de chás que a gente vez?? meu pai não acredita nisso, ele disse que é bobagem."
puxa, mas quem sabe tu começa a fazer uns chazinhos gelados só pra ele pegar o gosto??
Pensa, me olha, segue me olhando.
"minha avó vai morrer logo."
e ela toma um monte de remédio, né? e aposto que ela sabe muuitos chás bons, do tempo que ela era mais nova.
A profe da capoeira chama, vai começar a roda, ele sai, decerto decidido a refrescar o verão com chás, ou quem sabe a prolongar a vida da avó.
Pra todos viveram mais.Por uma vida com menos remédio.
no fim do dia, depois de dar tchau para as crianças na escola, chegando em casa, a turma da rua se reúne na porta, "ooh tia, ooooh tia, vem escrever comigo, tia? vamos brincar de amarelinha, tia?? minha mãe deixou, a minha também, oooh tia, vamos dar comida pro cachorro? tá na geladeira? deixa eu pegar, ohh tiiiiiiiiiia"
e vou adiando compromissos a fazer, lugares a ir, sono pra tirar, página do livro marcada para depois. O cachorro também quer afago, late alto, me encontra na parada, depois na rua, as crianças. As crianças, o cachorro e eu. Chega a noite e o livro segue marcado na mesma página. Adiando para depois das brincadeiras, das conversas e risadas, da comida do cachorro

sábado, 13 de dezembro de 2014

do dia-a-dia

pasta de dente, biscoito e leite condensado. Formigas precisam cuidar da higiene e vão ao mercado. 
Conversa entre as prateleiras sobre qual leite é o menos envenenado. Lemos os rótulos, rimos da nossa ignorância e lamentamos nossa morte alimentícia de todo dia. Dona Eva e eu.
Ela me ensina a bordar adereços em camisetas velhas, duas desconhecidas se conhecendo na frente da gôndola dos doces. Trocamos endereços, receitas e costuras. Talvez nunca a visite, mas já estou costurando, e ela deve estar pesquisando os nomes estranhos da composição do creme de leite que comprou.
Morrendo a cada refeição, cariando os dentes, costurando, aprendendo, dona Eva e eu já não somos desconhecidas, uma levará o sorriso da outra para onde for.

Tião Rocha


reecontros

encontro uma menina dos tempos dos abrigos, já não tão menina assim, trabalhando no caixa de um mercado. viva, alimentada, sorrindo, orgulhosamente sem filhos e não casada, "não dá pra ficar presa nisso, educadora, pobre tem que pensar mais." 
Mesmo funcionando 8h, 10h, 12h em um mercado, fiquei contente, guria que podia ter se perdido no mundão, está usando os instrumentos que tem a mão para se aprisionar menos. Meio limitado este meu contentamento, eu sei. Mas ao menos ela não parece adormecida, compreende a situação, sabe que precisa sobreviver, sabe que o tamanho do seu sonho não cabe nos pacotes que embrulha, mas embrulha pra não embrulhar o estomago no dia seguinte.

Cacchorrês

Uma cadelinha adotou um dos meus alunos, e o espera no portão da escola todas as manhãs; felizmente o grupo de profes se mostrou simpático a amizade e tem permitido a sua circulação no pátio. O caso é que hoje ela entrou na sala em que eu estava... e... Bom, Leo, o menino, bem entendido das sutilezas humanas, me diz:
"ela escolheu esta aula por que sabe que a sora não ia tocar!"
Passamos boa parte da manhã nos comunicando em cachorrês, entonando o latido em uivos ou sussurros. Comunicação garantida, explorando o corpo, expressão corporal, voz, locomoção a 4 patas. Chega a hora da merenda. Ai! Tiveram a ideia de comer sem as patas, digo, mãos! Boca na tigela, vira suco, vira pão, suja tudo. Recreio, a sora, já virada em gente de novo, seca, varre, limpa... e as sobras pra cadela!
E o tipo de vivencia, entre tantas, que não posso compartilhar numa reunião pedagógica, a menos que queira ser afastada por inadequação ao cargo. 

o crime inteiro para as escolas

mas olha, as vezes fazem parecer que os professores nasceram professores, que moram na escola, que passam as madrugadas sendo treinados para massificar as mentes infantis. Como se fossem os únicos a reproduzirem modelos, como se toda a sociedade fosse prisioneira das escolas, como se o que se faz aqui dentro não fosse reflexo do que se espera que se faça. Filhos campeões, competidores, clientes do mundo. Mas olha, cada vez que converso com um pai/mãe receoso com minha maneira pouco convencional de trabalhar, quando discuto com colegas em reuniões pedagógicas, quando as crianças me pedem qualquer coisa que tenha nota e julgamento segundo critérios da melhor reprodução, lembro que os espaços de ensino são feitos por pessoas e as pessoas são crias de um mundo doente, e que qualquer tentativa libertadora pode se tornar imposição se desconsiderar os desejos dos envolvidos nisso. E outra, a parcela de responsa das famílias e do convívio social parece não existir mais. Todo poder para as escolas, o crime inteiro para elas. Uma vez que escolhi ser professora e, não tenho problemas em me dizer professora, ando em crise permanente, meio sem saber quais são meus parceiros.

Morros de Muitos

"sora, a senhora sabe onde fica o São Pedro??"
o antigo hospital?
"é, onde ficam os loucos."
"é perto do carrefour, que é perto da puc, né?? Eu sei por que eu ando de ônibus sozinho por tudo"
A conversa segue com Calebson exibindo suas andanças pela cidade. Passamos pelo Harmonia, Jardim da Paz, Farrapos até a sombra da Redenção.
Conto que morava pertinho dali.
"É Sooora?? Onde?? Naquela rua que sobe e depois desce e vai parar na esquina daquela rua pequena???"
é.... pode ser que seja perto deste lugar...
"Sora, bah, sora, vamos tomar chimarrão lá nas férias?? Me passa teu face, endereço!!"
Nas férias nem fico em porto alegre, mas no próximo ano podemos combinar com a turma toda, uma tarde do parque.
"Tá, mas o sora, eles não andam como eu, eles vão tudo se perder, sora. Eles só conhecem os morro aqui, fora daqui eles se perdem tuudo."
E eu me perderia aqui nos morros. Combinamos assim: vocês me apresentam as quebradas da redondeza e eu e o Calebson levamos vocês no Centro, na Redenção, no rio Guaíba...
Espanto geral. "onde rio, sora? dá pra chegar de ônibus?"
Cidade desconhecida, cidade de alguns, além de parques com loucos, Morros de muitos.

bonito esquisito

mil verões depois, me permito comprar uma sandália, as crianças todos os dias me perguntavam se ela ainda não havia arrebentado, tamanho descolamento, kkk.
Bom, comprei. E levei embrulhada para que apreciassem. 
Adivinhem as cores....
"preta, verde, azul, marrom"
Marrom! Acertou uma e a outra? É cor de uma fruta...
"preta, cinza, amarela, vermelha, roxa, branca...."
E fruta cinza existe? Eu não conheço, mas podemos pesquisar. Tarefa de casa novinha, perguntar para família, amigos, vizinhos se conhecem alguma fruta cinza.
Marrom e Laranja.
"ai, sora, que coisa esquisita, parece de vovó!"
(não sabem que na verdade tenho alma de véinha)
Para vocês verem que tem gosto pra tudo neste mundo, que o bonito pode ser feio, e que o feio pode ser bonito.
"é, né, sora, mas eu acho que o teu bonito é esquisito!"

Aventuras no Shopping

"soooora, vem loogo, a gente vai ficar por último!!" Bel, clamando enquanto me arrastava pensando em como tornaria este passeio imposto interessante.
Pra que a pressa?? só tem venda ai dentro...
"é que eu nunca fui num shopping, sora, nem em cinema." Responde a menina agarrada num suco de 1 litro e em uma sacola cheia de lanche, pois havia alertado que nestes lugares, a alimentação é muito cara. Aligeirei o passo, e ao entrarmos na porta automática, a primeira baguncinha: entra-sai, abre-fecha, entra-fecha.
Banheiros, passa papel higiênico uma para a outra por cima, tenta descobrir se a colega está fazendo nº 1 ou nº 2. Pias que abrem com sensor, conta quantos segundos fica correndo água, repõe água na garrafa e tira foto do espelho.
Já na cia dos meninos, procuramos um lugar para nosso piquinique: bebidas, frutinhas, chocolate, bolachinhas espalhados sobre um banco.
"o chão desliza, soora!! dá pra patinar!!"
De barriguinha forrada, patinamos para desgastar a merenda.
Entrada do cinema: lemos as sinopses de todos os filmes em cartaz, conversamos sobre quais pareciam para crianças e por quê. O nosso: As Aventuras do avião Vermelho, adaptação da obra de Érico Veríssimo.
Esconde-esconde nos postes e placas da entrada, bate-esconde-deslizzzando até a aeronave de Capitão Tormenta. Todos acomodados no escurinho, aventuras levadas para casa, para as férias longe dos shoppings.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Pulseirando



Adriano escolhe minuciosamente a sequencia das cores

Adicionar legenda

Desafio é dar o nó seguro
Chão confeitado!


Turminhas confeccionando pulseiras, colares e anéis com miçangas coloridas e fio de silicone. Enfeites para a festa de Culminância da Consciência Negra de amanhã:


terça-feira, 18 de novembro de 2014


Buscando imagens de Orixás na internet, brincando de águas doces, fazendo a sora se vestir de Iemanjá: 









segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Abayomis versão 2014, outras turmas, outra escola


História das Abayomis:

http://marilhando.blogspot.com.br/2013/10/abayomis.html

Alexandre inventando outros modelos.... todos sem costura

Enquanto  recortavam e bolavam novos nós, assistíamos o filme 'Besouro: Nasce um Herói'



Personagens Negras em Livros Infanto-juvenis


Desafiei a gurizada a procurar imagens em livros com personagens negros e negras, durante o trabalho, partiu deles a ideia de buscar o mesmo em um site de jogos da internet, o Frive: 




      



Concluímos que: !- os negros e negras geralmente aparecem em livretos informativos, "sem graça" como disseram as crianças;
2- Tentam forçar uma inclusão, "botam um no meio pra disfarçar"

3- As histórias costuma ser as que abordam preconceito, 

4- Cirilo da novelinha Carrocel é o único negro da turminha e ainda é o sofredor. 


terça-feira, 11 de novembro de 2014

Religiões de matriz afro, um papo sobre

A mãe de uma das crianças aceitou vir na escola hoje, vestida como se estivesse indo a uma festa de religião, lindamente, nos falou sobre ritmos, orixás, pretos velhos e mais! Gurizada que já havia compartilhado suas vivencias em várias aulas anteriores, estava atiçada querendo que alguém encorporasse. O que encorporou foi o conhecimento e a maneira tranquila com que abordamos esta manifestação, tão presente na vida deles.  Gratidão Raphaella!


os diabos da educação

Parte 1 da conversa:
"mas eles furam a pele com estas tatuagens, fazem furo na orelha dese tamanho!, e ainda ficam brabos se alguém encosta assim no ombro deles, partem para a briga!!"
mas, dona fulana, o corpo é de cada um, as interferências que cada um faz em si não interfere no caráter, é diferente de outra pessoa me tocar, bater, seja lá o que for, sem meu consentimento..."
"Mas eles ficam parecendo INDIOSSS, isso não é normal!!!"
parte 2 da conversa:
"isso é tudo coisa de diabo, ora, trabalhar os orixás, eles já são agressivos, ainda ficar falando estas coisa em aula, não dá, já chega as novelas com estes beijos de homem pra homem, é a destruição da família, é isso que tu quer???"
Nesta hora, tirei meu casaco e expus uma tatuagem e se tivesse alguma mulher corajosa por perto, beijaria. Mas me limitei a rir, uma senhorinha aposentada defensora dos ditos bons costumes. Nas próximas conversas, vou sugerir que vá curtir o tempo longe destes diabos, longe deste gente nova que está diabolizando a educação, é o melhor que tem a fazer, pelo seu bem. 

diário de um gato

ganhei um filhote de gato "cinza e preguiçoso" de uma aluna. Um gato de presente para mim que nem moradia direito tenho, mas este gato foi a ponte para estabelecermos um combinado: ficaria com ele se a cada dia ela me descrevesse por escrito um diário da evolução do bichado. Tá ficando lindo. 
"ele mama menos mas tá forte."
"a mãe dele tem ciume de mim."
"ele é bem mansinho, quase nem briga."
"tá ficando mais cinza."
"hoje de manhã ele abriu os olhinhos."
Bom, estou redoando o cinza e preguiçoso filhote, interessados, miem ai.

dançando no tantantuntuntan

meninos e meninas desfiando seus ricos repertórios musicais... "e a casa caaaai, desceeennndo, lá em casa na piscina notadecem tantantuntuntan interesseiraa é o mc griliilo que chega e tantantuntuntan.........."
Bom, que me resta? dançar junto, que sabe é preciso entrar na doideira para entender o que se passa neste mundo que muitas vezes não compreendo as linguagens?

sucos naturais sem açucar


Máozinhas cortando, higienizando, ralando, batendo... 



suco de cenoura, casca de laranja e suco de limão nesta manhã. Descasca, rala, corta, espreme, suga, bate. Facas passando de mão em mão, cortes, apenas os necessários, tomamos o suco com todos os dedos e cabeças em seu lugar. Uffa!!!
Desde o feito, por volta das 10h, 6 alunos já correram ao banheiro e saem anunciando: "a culpa é daquele suco da sora Marília!!"
limpeza interna. 

Maculelando

Fui a Montenegro maculelar com as crianças no sábado. Festival da Semana da Consciência Negra. Saímos às 17h e voltamos já noite.
"sooora, que horas são?? é quase meia-noite??" 
"falta muito pra chegar o outro dia???"
                                                                     a Roda

A madrugada encanta a todas as idades mesmo, Dona Noite com seu charme enluarado tem um poder... Combinamos uma rodada de contação dos sonhos que tiverem no pouco que restou para chegar o outro dia 

Zumbi!

Pesquisando a vida de Zumbi. Não entendiam a sua importância na história.
Simulamos, então uma prisão, todos presos na escola (um toque de fel nisso).
No chão, acorrentados, um fuzil no pescoço (atualizando a coisa), trabalhando sem parar, uma hora limpando a sala, arrumando os livros, copiando, calculando, na pressão. Quem não fizesse algo no tempo certo, teria que trabalhar mais, copiando coisas sem sentido (mais um toque de fel). Fingimos que a direção era dona deles e eu responsável pelo cumprimento das ordens todas, sem bebedor, portas fechadas. Dai, um deles, que recebeu o sinal de libertador, começa a romper com isso, encontra um lugar na sombra do pátio e os leva para lá. Tarefa de casa: pensar em maneiras de driblar os mal tratos simulados hoje. E amanhã socializaremos a pesquisa e as ideias vindas disso tudo. Senhor das demandas, eu quero ver esta gurizada desaceitando.


a senzala


o libertador encontra a chave



terça-feira, 14 de outubro de 2014

a sora é do diaaabo

"o professora, (reparando de cima a baixo minhas saias desde o 1º dia de aula), tu é crente??"
crente em que, guri?
"ue, sora, crente daquelas que vão nasigreja!!"
não, não sou.
"tu é do batuque??"
batuque de batucar? não sei nem tocar tambor de lata.
"nãaao, daquelas que vão nas casa de santo e nas praia fazer batuuuque!!"
não, não sou.
"SORA TU É DE DEUS?????!!!"
não sei, se ser de deus é uma coisa boa, eu devo ser, eu acho. 
"a sora não sabe se é de deus, gente!! Tu viu essa??? a sora é d diaaaaabooo!!!"
é, e uso saia pra esconder o rabo! (não, esta última parte falei apenas mentalmente :p)
Recolhemos os panfletos dos candidatos que estavam espalhados na frente da escola. Tectectectec, montagens malucas: cabeça dum, perna doutro, tectectectec. Reinventamos os eleitos e não eleitos. Singela satisfação nesta manhã.
as vezes paro tudo, paraliso os assombros e observo por alguns minutos as agressões entre eles, o suficiente para não chorar e nem permitir que se machuquem. Preciso entender a dinâmica da coisa, relembrar o contexto violento em que vivem, respirar antes de me tornar tão ou mais agressiva que eles, 
"cara, para, para, tá vendo a cara da sora?? ela tá assustada, meu, ela é massa, para, para com isso, ela é massa, vem, ela tá triste, cara!!"
O corpo dói. Vejo colegas indo embora, buscando conforto, vejo colegas já anestesiados e não posso ficar assim. Prefiro a dor. Ou o conforto. Anestesia não dá.

dia das crianças

amanhã é dia de festa na escola, pelo dia das crianças, nem sei mais o que pensar sobre isto, é bom ver a alegria delas na espera, um dia em que são especiais, embora este especial inclua açucares e brindes de plástico. Vou festejar junto, isto é certo. E comer bolo e tomar suco em pó, e me lambuzar no cachorro-quente. Alegria compartilhada, crítica amenizada. Tomara que consiga.



Jogo stop com elementos da festa do dia das crianças: Comida, Bebida, Diversão, Lixo. Total. 
Várias marcas de refrigerante nas bebidas.
"eu também tomei água, mais que refrii, sooora!!"
Lixo?? Após muuuito pensarem e brigarem com a sora que colocou esta coisa no jogo, perceberam que produzimos mais lixo que gostaríamos: copos, papel, garrafas, balões estourados....
"oooh sora, tu quer deixar a gente triste depois da festa???"
Amanhã vamos fazer suco de cenoura e suco de couve. Couve colhida da hortinha, cenoura a sora leva.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Fantasmas da vida real

Manhã de Histórias fantástimagóricas..... escurinho.... criançada reunida, uuuuuuivos, arranhões, uuuuuuuuuu
"meu pai morreu com 4 tiro da polícia"
"meu vizinho lá de cima levo 1 aqui ó"
"meu ermão tava robando e levo uma tunda com ferro na cabeça"

Fantasmas existem? Talvez, mas não são eles que fazem buu na vida destes pequenos.
Sem determinismo, mas a dura escolinha da vida deles os faz apto aalguns vestibulares e apartados de outros tantos. Então, a estranha no ninho sou eu. O que quer dizer respeito para eles? O que quer dizer felicidade? A sobrevivência é quase uma sobrevida, que não vale mais nem menos que a minha, estranha no ninho, uma querida estranha no ninho, que oscila entre o espanto e a compreensão bem sentada no seu sofá escrevendo sobre o que vive com eles dentro de um espaço-santo, em que se sentem seguros, alimentados, ouvidos, mas... que pouco se comunica com as perspectivas garantidas pela posição social em que nasceram.
Matemática da bala perdida?
Ciências da desnutrição?
Estudos Sociais dos de baixo?
Ed. Física da defesa pessoal?
Ed. Artística do esgoto?
Português da negociação dos que servem sem escolha?
macaquinhos e macaquinhas coletando folhas de goiabeira e de boldo. 
"deeeeeeeeeeeesçam dai!!" chamado dos superiores.
"mmmmas a soooooora deixooooooooou"
e a sora já com o pé na árvore, volta e chama a macacada de volta a sala. 
primeira cumplicidade nossa. Inicia-se as trocas silenciosas de olhares, de macaquinha a macaqinhs!

Teto para a sora 2

hoje um dos meninos que buscou teto para a profe aqui e eu nos encontramos na biblioteca, ele todo atrapalhado com uma prova de interpretação textual. O texto mal xerocado, extraído do trecho do fim do capítulo de um livro perdido na internet...  Sentei ao seu lado, pedi que lesse, as sílabas saiam como pedras da boca. Li eu. Li de novo, Comentamos. Tentamos encontrar na internet a autoria. Li de novo. Interpretamos oralmente. Depois, a escrita, devagar, marcamos outro encontro para ver questões da gramatica e leitura. Quem se move para buscar moradia para o outro, merece ler o mundo por conta!
!

Teto para a sora

cena para guardar no coração eternamente: havia pedido sugestões de lugares, caso soubesse, para alugar no bairro. Hoje, três meninos vem ao meu encontro eufóricos contando que "sooora, sora, sora, tem uma casa aqui do lado, vem ver, vem, vem, a gente já pediu pra dire, ela deixooooooou!!"
E lá fomos nós portão a fora, atravessando praças e jardins do morro até encontrar uma placa de aluga-se. 
"Ohhh moooooço, tu sabe da casa pra alugar??? Casa pra alugar, esta ali da placa!"
'qual o nome da dona??' (anotando na mão o nome e telefone de contato)
Eu na espera, guarnecida pelos meninos empenhados na minha moradia. Inesquecível.

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Manhã de Histórias fantástimagóricas..... escurinho.... criançada reunida, uuuuuuivos, arranhões, uuuuuuuuuu
"meu pai morreu com 4 tiro da polícia"
"meu vizinho lá de cima levo 1 aqui ó"
"meu ermão tava robando e levo uma tunda com ferro na cabeça"

Fantasmas existem? Talvez, mas não são eles que fazem buu na vida destes pequenos.
Sem determinismo, mas a dura escolinha da vida deles os faz apto aalguns vestibulares e apartados de outros tantos. Então, a estranha no ninho sou eu. O que quer dizer respeito para eles? O que quer dizer felicidade? A sobrevivência é quase uma sobrevida, que não vale mais nem menos que a minha, estranha no ninho, uma querida estranha no ninho, que oscila entre o espanto e a compreensão bem sentada no seu sofá escrevendo sobre o que vive com eles dentro de um espaço-santo, em que se sentem seguros, alimentados, ouvidos, mas... que pouco se comunica com as perspectivas garantidas pela posição social em que nasceram.

Catarse dos palavrões

Catarse dos palavrões: escrevam todas as palavras que considerem um palavrão! Caixa-secreta lotada de caralho, cacete, putaria, cú, cú, cú, filho da puta, bosta, pau e muuuuuito mais.
Dicionario e conversa sobre cada significado.
Descobriram que caralho é pênis, cacete também, além de porrada e objeto de bater. Prostituição é profissão, cú é sinônimo de ânus, riram da piada quantos anus você tem, porra e é produzido pelo adulto e ajuda a ter filhos,merda, bosta são excrementos que quem come produz, e perceberam que cala a boca é bem mais agressivo que qualquer um deles, vai da intensão ao falar. Entre tantas outras descobertas que provocaram risos e surpresas.
E filho, filha da mãe????
Pensa, pensa, discute, especula:
"deve ser aquele cara que vive do dinheiro da mãe, que não faz nada"
ah, e a sensação do momento: a sora já usou maconha e não tá doida. E que existem muitas drogas consumidas diariamente, até o açúcar, vejam só!
e no filme do Menino Maluquinho, o pião vai rodopiando lentamente até a morte do avô. 
"é o pião da vida." (com um ar de poeta)
"os circuitos do cérebro pararam" (exatidão de cientista)
"aaaaai, que dooooooooor, sooooora, posso chorarrrrrrr???" (dramatizando com uma atriz em cena)

São todos crianças, mesma faixa etária. Sentindo o mundo a sua maneira. E assim cresceram. Na diversidade de óculos do mundo. E eu, nos meus quase 30 anos, revendo as minhas lentes a cada dia.
E, alias, hojé é dia do Filósofo. Um salve a todos os filosofantes não formatados pela academia.

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Lembro bem do Chupeta

Lembro bem de um colega da 2ª série, apelido de Chupeta: mais velho, alto, forte, que ia à escola de chinelos havaianas, pé azul, pé preto, consertado com prego. Nos meus 7 anos, ele doía em mim, seu olhar revoltado era um escárnio a minha meninice feliz e bem alimentada. 
Tinha o costume de virar as pálpebras fazendo uma faixa vermelha do inferno na terra. Lembro bem. Evadiu antes do término do ano, deve ter ido acertar as contas com a vida que lhe deram.
Hoje os meninos da nova turma-manhã sinalizaram com a mesma faixa de sangue nos olhos. O horror que me invadiu transpareceu no meu semblante, sai de perto fui ao banheiro lavar o rosto, o Chupeta ainda acerta as contas com a vida que lhe deram, meu deus.

domingo, 10 de agosto de 2014

Cartas para você

Na nova turma-tarde, recebi cartas nas férias: contavam um pouco sobre cada um deles e me enviavam uma palavra-secreta. Antes das férias, lhes passei meu endereço e fiquei no aguardo do carteiro. Dai relembrei este trabalho feito com o 2º no lá na Pintada:

Toda segunda-feira, escreviam um recado para alguém... Ou simplesmente algo que gostariam que fosse lido

no decorrer da semana, passavamos a caixa de cartas na rodinha, e liamos os recadinhos postados

Lanternas Juninas

Preparando a nossa sala para receber o calor junino, aquecendo as mãozinhas e o coração: